AGHORI "O CULTO DA MORTE" - Frater: Ryujin.

Muito se especula sobre os Aghoris, porém pouco se fala sobre informações realmente relevantes ou que passam uma seriedade. Geralmente são um monte de informações infundadas ou até mesmo baseadas no preconceito. No entanto, hoje vamos explorar um pouco mais sobre esse lado, entender os Aghori e mostrar um pouco dessa cultura nada convencional.


Os Aghoris são membros de uma seita ascética do hinduísmo, sendo conhecida por suas práticas espirituais extremas e muitas vezes mal compreendidas na atual sociedade em que vivemos. Eles são considerados devotos de Shiva e seguem uma abordagem única em relação à espiritualidade e ao mundo material. Os Aghoris acreditam na transcendência das dualidades, como o bem e o mal, buscando a superação da dualidade, renegando a dualidade e aceitando o não dual. A realização espiritual pode ser alcançada através da superação de tabus e da aceitação de todos os aspectos da existência. Isso inclui práticas que podem ser consideradas chocantes ou incomuns, como o consumo de carne humana, meditação em locais de cremação, uso de cinzas crematórias no corpo, ossos de humanos como crânios, fêmur e entre outros.


No entanto, é importante notar que as práticas dos Aghoris são frequentemente mal interpretadas. Para eles, essas ações extremas têm um propósito espiritual específico e simbólico, buscando a transcendência das limitações do mundo material e a realização da união com o divino. Além de simplesmente ser uma prática não convencional, também é uma forma de regeneração da alma e renegação do mundo humano. No processo do ritual, a realidade material é renegada.



FILOSOFIA E MODO DE VIDA

A filosofia deles é muito prática, seguindo uma abordagem não dual, onde rejeitam o princípio de dualidade e separação das coisas, acreditando no princípio único indivisível das coisas, onde tudo está inteiramente conectado e nada se divide, pois tudo no final se torna um só. Referente ao modo de vida, Aghoris seguem um meio de vida único, dormindo em cemitérios e campos de cremação, geralmente se enterram na areia ou então sobre a neve, sobrevivem com as coisas que vêm da natureza e geralmente pescam corpos que são jogados no Rio Ganges. Esses corpos são devidamente pescados e levados com eles, retirando os ossos e a carne. Os ossos se tornam ferramentas para as práticas de trabalho, podendo se tornar baquetas para o direcionamento de energia. Os crânios podem se tornar representações ou então virar lindos e belos colares de crânios. O restante dos ossos é utilizado para os diferentes ritos. É uma vida simples, geralmente não tendo muito contato com outras pessoas e podem ser um pouco agressivos com aqueles curiosos que decidem adentrar. Eles também fazem misturas a partir de fezes de animais, urina e até mesmo outros elementos, criando banhos e misturas que servem para purificação e limpeza do corpo e mente.



AGHORIS E KAAL BHAIRAVA

Antes de tudo, Bhairava é uma poderosa forma de Shiva. Nesta forma, ele é considerado o senhor do submundo, aquele que reina na própria morte e governa os mortos, pois ele é o próprio "Yama". Bhairava é um homem muito bonito, mas que geralmente é representado totalmente nu, ou somente com uma tanguinha. Assim como Kali, que muitas vezes é representada sem roupa nenhuma, Bhairava aparece sem roupa pelo mesmo motivo: representando a conexão com a natureza, a pureza espiritual e a desconexão mundana e dos conceitos humanos. Então, sua nudez não é vista de uma forma negativa, mas sim, representando a natureza espiritual.

Bhairava sempre está acompanhado de seu tridente, com o seu corpo totalmente azul ou negro, com a pele banhada de cinzas e sempre acompanhado de um cão negro. Em algumas ocasiões, pode ser representado na cor branca, porém geralmente é um cão negro, e não é qualquer cão, gente, é um cão de rua.

Antes de seguir com a continuação, vou trazer uma pequena curiosidade sobre o cão negro e a relação com Kaal Bhairava. Na Índia, a relação de Bhairava e os cães negros são bem conhecidas e poderosas. No entanto, como disse no texto acima, não é exatamente qualquer cão, é mais especificamente os cães de rua. Sim, isso que você ouviu, sabe os caramelos que a gente encontra por aí? Então, exatamente esses, pode ser caramelos, caramelos pretinhos, caramelos branquinhos, todos os tipos de caramelos. A tradição fala que todos os cachorros de rua são de Kaal. Por isso, geralmente, esses animais são tratados com o maior respeito e referência, pois acreditam que é o próprio Bhairava observando eles e suas ações. Então, esses cachorros são bem aceitos e bem tratados por todos, inclusive nos templos dedicados a Shiva. Os cachorros, serpente e touros são os verdadeiros Reis do momento.

Voltando para a relação do submundo, acreditam que esses cães que são encontrados nas ruas, principalmente aqueles que são negros, são uma representação direta da divindade, mas também a própria morte caminhando e livrando as pessoas da morte. Não é que o cachorro vai trazer a morte ou livrar uma pessoa da morte, mas é um lembrete e também um sinal muito auspicioso, pois na tradição acredita-se que o cão está trazendo a proteção de Bhairava, pois esses cães andam lado a lado com o Deus do submundo. Algumas pessoas podem até não acreditar, mas existem bastante histórias e relatos na Índia onde acontecimentos fatais ou até mesmo pessoas que foram livradas desses acontecimentos, sempre na presença de um cão negro, mas como eu disse, são histórias e lendas baseadas na própria mitologia e na crença popular do povo.

Agora que já entendemos sobre Kaal, Aghori e os cães, podemos finalmente entender a relação entre todos eles e como tudo isso funciona na prática. Os Aghori são totalmente devotos de Shiva, e Kaal é uma das poderosas formas na qual o Deus é chamado. Geralmente, é sempre feito um grande ritual onde utilizam elementos de morte para a comunicação com o Deus, mas isso será explorado um pouco mais adiante. Além disso, o próprio Kaal pode ser chamado, eles também podem chamar espíritos, pretas e até mesmo Ashuras. Acreditam que a ligação na prática da morte e da necromancia pode ser uma poderosa forma de trabalho, sendo um portal direto para a transcendência, trabalhando assim com diferentes níveis de morte.



RITUAIS DE MORTE

Os Aghori são conhecidos exatamente por suas práticas de morte, onde podem acessar diferentes níveis de estados de consciência que levam à morte. Geralmente, esses rituais são bem intensivos e muitas vezes podem se tornar agressivos no corpo quando não direcionados de uma forma correta. Os rituais de morte são baseados para alcançar a transcendência da mente, superando a dualidade e vivenciando e abraçando o não dual. Os Aghori entendem que a dualidade existe, sendo uma parte importante para o funcionamento do universo, mas eles seguem a abordagem de superar a dualidade, abraçando a unidade das coisas e levando para o princípio único e indivisível.

Os rituais de morte geralmente são feitos em cemitérios ou campos de cremação, podendo ser acompanhados pela presença do Deus do submundo ou até mesmo de Kali. Antes de iniciar o ritual, os Aghoris tomam um banho de cinzas, esfregando por todo o corpo, e retiram todas suas roupas, muitas vezes ficam somente com uma tanguinha ou então totalmente nus. A nudez tem o mesmo princípio que foi associado a Kaal, mostrando a superação do material, a pureza espiritual e a superação do ego. Durante o ritual, eles podem consumir carne humana, usar colares feitos de ossos e crânios, ou até mesmo utilizar ossos para o direcionamento energético. Após todas as orações, mantras e canções, eles entram em uma meditação profunda, acessando diferentes níveis de consciência e até mesmo de morte. Durante a prática, eles vivenciam na pele como é morrer, vendo seu corpo morrendo enquanto sua alma/mente continua viva, vivenciando os processos que acontecem com o corpo: a morte, como o corpo é consumido e dissolvido pelos bichos, apodrecimento, os ossos, e até mesmo como a terra absorve e engole totalmente esse corpo.

É uma prática extremamente rigorosa e que pode ser perigosa, por isso ela não pode ser feita sozinha, ou sem o acompanhamento de uma pessoa mais experiente. Dizem que o risco de morte realmente pode acontecer, principalmente se você for uma pessoa inexperiente e não souber guiar a sua própria mente, pois é um processo tão intenso e extensivo que você realmente acredita que está morto. Por isso, em alguns casos acaba sendo necessário uma pessoa mais experiente para te guiar e trazer de volta dessa imersão profunda. Geralmente não é uma prática que é ensinada para qualquer pessoa e só pode ser aprendida durante ou pela vivência com os Aghori. No entanto, ainda é possível encontrar livros que explicam essa prática de uma maneira relativamente útil, porém ainda assim é uma prática séria e que não pode ser feita por qualquer pessoa sem experiência.



AGHORI TANTRA

O Aghori Tantra é uma prática da mão esquerda, que segue o caminho não convencional, onde os praticantes utilizam ossos, consomem carne e quebram tabus estabelecidos na sociedade. Os praticantes do Aghori Tantra geralmente não são tão radicais quanto os Aghori tradicionais e levam uma vida mais comum, embora possam participar de alguns rituais com os Aghori. No Aghori Tantra, a filosofia e as práticas não convencionais são seguidas, porém de forma menos rigorosa. Atualmente, tornou-se menos restrito, pois não é mais necessário entrar no território dos Aghori para aprender, mas ainda há uma diferença significativa entre o Aghori Tantra praticado por pessoas comuns e pelos próprios Aghori, já que estes últimos apresentam uma energia mais crua e visceral. Mesmo que seja possível aprender o Aghori Tantra sem estar no território Aghori, ainda pode ser uma prática difícil de encontrar e até mesmo de praticar fora das regiões específicas.



CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ser um Aghori não se resume apenas a atividades extremas como comer carne humana, usar ossos como adorno, passar cinzas no corpo ou se enterrar na areia. Ser Aghori é compreender a realidade do mundo material e, a partir disso, buscar transcender essa realidade. Não se trata apenas de ações ou vivências extremas e assustadoras, mas sim de compreender o propósito por trás de cada uma delas. Ser Aghori também é uma forma de arte, muitos artistas se inspiram na cultura Aghori para criar obras únicas e transformadoras. A prática pode ser vista de maneiras diversas, intensas, filosóficas, artísticas, dependendo da pessoa e de como ela deseja incorporar esses princípios em sua vida.

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